O movimento Outubro Rosa marca o mês de conscientização do cuidado e de prevenção ao câncer de mama, mas também ressalta a importância de se compreender e dialogar sobre a relação do tratamento do câncer de mama e as doenças mentais, para o enfrentamento de todo o processo.
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Em entrevista (5) à Agência Brasil, o psiquiatra Joel Rennó, coordenador da Comissão de Estudos e Pesquisa da Saúde Mental da Mulher da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), disse que uma em quatro mulheres que recebem diagnóstico de câncer de mama acabam sendo mais vulneráveis a desenvolver um quadro de depressão.
“A gente pode analisar múltiplos fatores envolvidos que englobam diversas fases, desde o diagnóstico, o prognóstico, o tratamento e os efeitos adversos colaterais que, muitas vezes, vêm acompanhados nos tipos de câncer de mama mais agressivos, em função do tratamento”, explicou o psiquiatra. Segundo o médico, alguns tratamentos provocam gatilhos que podem ser estressores para o início ou até para piora de um quadro depressivo nessas pacientes.
O médico Joel Rennó alertou que nesse momento de pandemia do novo coronavírus (covid-19), muitas mulheres procuram tardiamente ou estão adiando seus exames de rotina. “Isso também acaba sendo um grande problema porque, às vezes, você pode não descobrir um estágio precoce do câncer de mama, que leva a um melhor prognóstico”.
Transtornos
Para o psiquiatra Jorge Jaber, membro da Academia Nacional de Medicina (ANM), a alta incidência de depressão e ansiedade em mulheres com diagnóstico de câncer de mama envolve tanto fatores emocionais, como físicos. “Por atingir os seios, órgãos associados à feminilidade, sexualidade e maternidade, o câncer de mama tem impacto direto na estrutura emocional e psicológica da mulher, podendo provocar uma redução em sua autoestima e, consequentemente, na sua própria capacidade de criar resistência imunológica às células cancerígenas”.
Jaber lembrou que, ao mesmo tempo, o câncer, em si, provoca alterações no metabolismo, que podem abrir caminho para transtornos mentais como a depressão e a ansiedade. “É um processo que se autoalimenta”, disse, acrescentando que não se trata somente de uma questão de autoestima. “Por seu simbolismo e estigma, o câncer torna mais palpável a consciência da morte, que pode gerar uma reação depressiva, que diminui a capacidade de resposta do organismo não apenas contra o agente invasor, mas também contra os problemas mentais”.
Estigma
Como todo câncer, o de mama é uma doença oncológica que gera, muitas vezes, um estigma, segundo o coordenador da Comissão de Estudos e Pesquisa da Saúde Mental da Mulher da ABP, Joel Rennó. Ele avalia, no entanto, que tem melhorado gradativamente essa visão, já que a ciência tem evoluído e sabe-se que 90% dos casos de câncer de mama diagnosticados precocemente acabam tendo sucesso terapêutico e uma sobrevida significativa depois do período de acompanhamento de cinco anos. “De qualquer forma, o câncer ainda é uma doença estigmatizante, assim como a doença mental”.
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O médico disse que por ser ainda uma doença estigmatizante, as reações iniciais em muitas mulheres são de medo, de angústia, de questionamentos sobre a razão de aquilo ter acontecido com elas, que sempre tiveram bons hábitos de vida, com exercícios físicos e alimentação saudável.
“Tem esse estágio inicial de uma reação de luta, associada à tristeza, inconformismo, períodos de desesperança, irritabilidade, dificuldade de aceitação”, explica o médico. Joel Rennó é de opinião, no entanto, que de alguma forma vai tendo um ajuste, e as mulheres são orientadas por bons profissionais da área de oncologia clínica para enfrentar o tratamento.
“Cada uma tem uma resiliência. Umas lidam bem logo de início, outras passam por essas instabilidades emocionais e, depois, acabam de alguma maneira racionalizando a situação e aprendendo a lidar com ela”.
Joel Rennó destacou também que é difícil para a mulher que se descobre com câncer de mama nesse tempo de pandemia abrir mão do papel de cuidadora dos filhos, da casa, durante o tratamento. Muitas mulheres se culpam durante o período de tratamento oncológico, por não estarem conseguindo dar conta dessas demandas. Diante desse quadro, o médico recomenda que “dentro do possível”, as mulheres não fiquem focadas só na doença, nas dificuldades de tratamento, mas ressignifique experiências de vida.
A situação de pandemia, segundo o médico, provoca depressão em muitos indivíduos pela falta de controle em relação ao futuro, e que o câncer já dava isso individualmente porque leva as pessoas, a partir do diagnóstico, a rever o dia a dia sem fazer muitas projeções em relação ao futuro.
No entendimento de Joel Rennó, o câncer por si só é uma doença estressante tanto para a mulher que está fazendo o tratamento, como para seus familiares. Por isso, ele salienta a importância de que haja um suporte do ponto de vista psicoafetivo no período que envolve o tratamento para que a mulher não se sinta inútil e que haja parceria com o companheiro.
Enfrentamento
Jorge Jaber ressaltou a importância de campanhas como o Outubro Rosa e a atuação de grupos de apoio como o do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca). Jaber afirmou que é preciso desmistificar o câncer como uma sentença de morte, o que ajuda a mulher no combate à doença.
Joel Rennó defendeu que a mulher que descobriu um tumor de mama tenha apoio psiquiátrico desde o início do processo, porque se pode com isso prevenir que os quadros de depressão e ansiedade se agravem.
“A gente sabe que quanto melhor a pessoa estiver do ponto de vista da saúde mental, mais chances ela tem de fazer todos os tratamentos e ter hábitos que contribuam para o sucesso terapêutico”.